sábado, 8 de maio de 2010


EU E TU

Vem
Vamos fazer um hino à esperança
Fazemos assim
Trazes os sons da música
Eu levo as asas e os movimentos da dança
E depois
Se alguma beleza faltar
Não tenhamos receios
Afogarei a minha voz
E o meu coração
Na brancura dos teus seios
Vem,
Vamos cantar o sonho
Somos capazes de o fazer
Basta contornar o tempo
Iludir a vida ou a razão
Veremos que o sonho vem
Não será mais ilusão
Vem,
Vamos escrever palavras belas
Soltas e com sentido
Pegamos nos sons
Desenhamos as letras
E no mar escrevemos
Apenas no mar
Todos os momentos que temos vivido
Vem,
Vamos voltar ao tempo
Em que a vida era feita a cantar
E a semear flores nas nossas mãos
Ou no nosso caminho
Se o tempo faltar
E se as flores tiverem morrido
Não te lamentes
É sinal que o tempo já está preenchido
Vem
Vamos desenhar as nuvens
Ou o voo das aves no céu despido
Que está à frente da nossa visão
Trazes as cores
Pintarei as asas
E o céu por cima das casas
Terá a cor da nossa paixão
Vem
Vamos ficar assim
Sem nada fazer
Sem nada exigir
Porque somos felizes sem qualquer condição
Agora aqui
Mas se te fores embora
Não olhes para trás
Para não veres as lágrimas
Que choro por ti.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

SONHO

Comi cerejas azuis
No país da ilusão
Quase fiz amor com o vento
Mas resisti à tentação
Deixei-me levar pelas ondas
Que nestas janelas batiam
E o algodão em que me sento
Cheira a doce de melancia
Deitei-me nas penas que voam
Encharquei-me em pedras tão puras
Que sinto que as horas magoam
Nas dores cortantes, porque são duras
Levantei-me e andei despido
À porta do tempo parado
Bebi do vinho que andava perdido
Sem se ter embriagado
Olhei para dentro das árvores
E vi que estavam a falar
Dei conta da conversa que tinham
Mas recusei-me a participar
Enrolei os dedos em linho
Senti um fogo que me apagava
Aconcheguei-me na cama, sozinho
Abri os olhos… sonhava.

AMARGURA

Podem as águas voltar
Às nascentes de onde vieram
Podem as andorinhas emigrar
Porque o calor não receberam
Podem as flores murchar
Porque a seiva não beberam
Podem as chamas apartar
Os corpos que não aqueceram
Podem os sonhos regressar
Aos leitos que os esconderam
Só não pode o tempo fugir
Da vida ou deste cansaço
Só não podem as lágrimas iludir
A tristeza em que me desfaço
Só não pode o sol esconder-se
Por detrás da nuvem que inventei
Só não pode a tristeza meter-se
Onde o optimismo foi rei
Só não pode o infinito sem cor
Cegar os olhos já sem visão
Mas posso ir e não voltar
Se a esta vida disser que não!

quinta-feira, 6 de maio de 2010

FANTASMA DE MIM

Incompletas-me o tempo
Balbucias-me sonhos quebrados
Deslizas, de forma suave, para lá da existência da vida
Desagradas-me
Imperfeitas as esperanças que não completas
Ocultas-te nas cores que me perturbam
Somente o coração
Evades-te
Refugias-te na seda da solidão
Por que te aniquilas para dentro da fuga?
Por que te renegas em cada ruga?
Destapas cada raio de sol com a escuridão da noite
Por que apenas lamentas
Por que apenas te ausentas
E não regressas ao tempo em que eras feliz?
Procura o rio que passa à tua porta
E navega no seu leito
Deixa-te levar
Verás que nasce
De novo
Um girassol dentro do teu peito
E com ele irás em busca do brilho do astro-rei
Mas vai
Solta-te
Solta-me
Quem tu és eu já não sei!

segunda-feira, 3 de maio de 2010

RETRATO

Quando eu era criança
Não havia guerras
Não havia maldade
Havia frutos frescos
Vendidos de porta em porta
E o tempo
Eram os dias
E não tinha qualquer idade
Quando eu era criança
A terra, as flores, os gatos e o sol
Brincavam comigo às escondidas
Na rua, mesmo ao luar
Roubava tempo à vida
Fazia da minha idade uma idade esquecida
Ajudava qualquer pássaro a voar

Cresci
Na juventude conheci a ilusão
Lidei mal com a emoção
Mas vivi
Nem sempre nesse tempo
E nem sempre sentia o bater do coração

Mas,
Ó tempo
Ganhaste asas e aprendeste a voar
Não consigo acompanhar-te
Na rapidez do teu passar
Há saudades dos frutos
Que se vendiam de porta em porta
Dos gatos sempre a brincar
Do voo do pássaro indefeso
Sem ninho


E agora,
Ó vida
Perdeste a infância esquecida
Mataste a juventude iludida
Mas não eliminaste a bela batida

Que sinto no meu coração.
ARCO-ÍRIS

Tenho nos olhos a cor
Que o mundo me ofereceu
São olhos da cor da alma
Agrestes
Pincelados de ilusão
Calmos, ondulantes
Por vezes rebeldes,
Mas são olhos pintados
Das cores do meu coração
O meu mundo não tem cores
Suficientes para este olhar
Por isso nos meus olhos busco
As tintas para este mundo pintar
Vou aos montes e tiro o verde
Porque a cor me deixa sonhar
Vou ao rio e trago o azul
Para me poder alimentar
Vou ao sol e trago o brilho
Para na vida estar mais colorido
E se a mistura de cores não me agrada
Fecho os olhos
Deixo o mundo
Mas antes faço um arco-íris
Sem cores, mas com sentido.

Sinto que sou semente
Ou indefesa raiz
Palavra de um léxico inexistente
Deste viver aprendiz
Sonho que sou onda de um mar
Cuja vida me invadiu
Queria ser asa, vento, luar
Ou sair desta vida que me fugiu
Sinto que sou flor despida
Na natureza abandonada
Bebo a água desta vida
Nunca tenho a sede saciada
Sonho que trago os meus dias
Cheios de palavras ou gente boa
Revejo-me nas noites frias
Quando o tempo me magoa
Sinto que voo sem qualquer asa
Num espaço vazio do meu tamanho
Vivo para lá da minha casa
Sou deste mundo e mundo não tenho
Sonho que sou nuvem em movimento
À hora do dia fechar
Ave muda, pedra em crescimento
Barco triste, sem navegar
Sinto que beijo a vida
De uma forma quase transparente
Se sou uma alma esquecida
Quero voltar a ser gente.